ENTREVISTA
26-abr.2019
Sandra Soares é Coordenadora do “Workpackage 5: Comunicação e Disseminação” do Programa “CeNTER – Redes e Comunidades para a Inovação Territorial”.
Doutorada em Psicologia pelo Instituto Karolinska (Suécia), Sandra Soares desempenha, atualmente, a função de Pró-reitora para a inovação curricular e a internacionalização da formação dos primeiros e segundos ciclos de formação da Universidade de Aveiro. É Professora Auxiliar no Departamento de Educação e Psicologia da Universidade de Aveiro, membro integrado do CINTESIS.UA e colaboradora no William James Research Center (ISPA, Lisboa) e no Instituto Karolinska.
Enquanto investigadora, tem feito o seu percurso nas áreas da Psicologia Experimental e das Neurociências e coordena vários projetos de investigação na área da Psicologia das Emoções, em contextos laboratoriais e aplicados. A ligação entre o laboratório e o contexto real, em conjugação com três outras premissas – desafios, diversidade e o contacto com pessoas – são ingrediente essencial para, refere, “trabalhar sempre de sorriso”.
Como se envolveu no Programa CeNTER?
A minha entrada no CeNTER desvia-se um pouco daquilo que é o meu percurso anterior, por um lado, e, por outro, não. Eu passo a explicar. Desvia no sentido em que o meu percurso é a Psicologia, mas a Psicologia Experimental e as Neurociências, em particular, o que é um “território” marcadamente distinto dos objetivos do Programa CeNTER. No CeNTER não temos esta dimensão da psicologia experimental, mas sim a psicometria e a avaliação do impacto de medidas de auto-relato, neste caso, da qualidade de vida associada à inovação de base territorial. Contudo, o meu trabalho em Psicologia e Neurociências relaciona-se com o processamento emocional. Ora, a qualidade de vida e o bem-estar, focos de análise no CeNTER , relacionam-se significativamente com as emoções, pelo que a minha relação com o Programa CeNTER acaba por surgir como algo natural.
Outro fator que explica a minha participação é porque muito do meu trabalho é interdisciplinar. É, efetivamente, a primeira vez que tenho uma maior relação com áreas mais ligadas às Ciências Sociais, uma vez que o trabalho que faço com outras áreas científicas acontece sobretudo com as Ciências mais básicas, nomeadamente com as Engenharias, e, portanto, este é um acrescento a esse percurso cada vez mais transdisciplinar que vou incutindo na minha carreira e que me entusiasma particularmente. Faltava esta camada no meu percurso e o CeNTER veio, com toda a certeza, complementar esse vazio. Ainda para mais é um projeto que congrega diferentes dimensões e diferentes áreas dentro da grande área das Ciências Sociais e, nessa medida, penso que é um acrescento muito rico na minha carreira e é com muito gosto que aqui estou.
O convite surgiu de colegas do Departamento de Educação e Psicologia, que é um Departamento que está envolvido no Programa, e, provavelmente, porque tenho interesse no estudo das emoções, pelo impacto que estas assumem na qualidade de vida e no bem-estar. Penso que poderá ter surgido daí e talvez também do interesse em interagir com outras áreas científicas. Presumo que tenha sido esse o mote do convite para integrar o CeNTER, que acompanhei desde logo na equipa inicial e na preparação da candidatura.
E qual o balanço que faz, em termos pessoais?
O balanço é de uma aprendizagem contínua, aos mais diversos níveis. Como disse, esta é uma dimensão do meu percurso que não tinha ainda explorado e o que é novo entusiasma-me. Implica aprender a comunicar e aprender a linguagem muito própria de outras áreas das Ciências Sociais que eu não domino. Começo a sentir-me mais à vontade para discutir temas de outras áreas das Ciências Sociais e interligar com aquilo que eu já fazia e conhecia, pela participação no CeNTER. Penso que isso é de uma riqueza muito significativa, quer profissional quer pessoalmente.
Que momentos destaca como mais relevantes desde o início do projeto, em abril de 2017?
Este desafio tremendo de colocar diferentes áreas das Ciências Sociais a comunicar é algo relativamente singular, não só na Universidade de Aveiro, mas penso que também a nível nacional e internacional. Na verdade, ao embrenharmo-nos na literatura percebemos que esta interligação entre áreas é efetivamente muito escassa, apesar de ser absolutamente fundamental. No caso específico da Psicologia, as questões relativas ao capital humano e à qualidade de vida surgem, de facto, muito negligenciadas na literatura sobre inovação territorial e, como tal, este parece-me ser um acrescento absolutamente central e inovador neste panorama. Nessa perspetiva, acho que é muito vantajoso para todos nós e para a região fazer este trabalho conjunto.
A coordenação do “WP5: Comunicação e Disseminação” tem sido igualmente desafiante. Penso que se trata de uma dimensão muito relevante – todas são obviamente muito relevantes – mas, de facto, a comunicação e disseminação do que fazemos no CeNTER, das suas singularidades, daquilo que distingue e destaca o projeto, acho que é outro dos desafios que é muito interessante de ver alcançado. Se pensarmos nos outputs e nos Seminários, julgo que esses são momentos importantes para revelar e apresentar à comunidade – não só interna, mas também externa, nos diferentes stakeholders que têm interesse nesta matéria – aquilo que estamos a fazer. Esta ligação com o exterior é fundamental para o projeto e é uma das suas singularidades. A investigação que estamos a desenvolver e o desafio que temos em mãos, pode ter um impacto significativo, por exemplo, junto de quem decide. E, como tal, é preciso chamar estes atores para discutir estes temas connosco, no sentido de perceberem/percebermos, em conjunto, onde estamos e para onde vamos.
Considerando a sua área científica e o trabalho que tem vindo a desenvolver, qual é o principal contributo que o Programa CeNTER oferece à região Centro?
O centro de tudo são as pessoas e sem elas não se inova. E para que exista inovação, criatividade, ou para que existam ações – ou propostas de ações – proactivas tem, necessariamente, de existir um pilar essencial que é o bem-estar, a qualidade de vida. Nessa perspetiva, é fundamental que o projeto alcance a comunidade e quem decide. É importante que surjam daqui indicações para quem decide sobre quais podem ser as estratégias a implementar para garantir esses “mínimos olímpicos” que tornam possível a inovação.
Do ponto de vista prático, penso que aquilo que poderia ser um contributo muito interessante para o CeNTER é o projeto do Banco de Iniciativas Inovadoras, porque poderia ser um estudo de caso muito interessante para percebermos quais os ingredientes para que isso aconteça. No fundo, analisar os casos de sucesso e o que está subjacente a esses casos, nomeadamente fatores psicológicos, pode ajudar-nos a compreender quais as condições essenciais para que estes processos possam emergir naturalmente.
Quais os principais desafios enquanto investigador do Programa CeNTER?
Os desafios passam por ter uma equipa que tem linguagens, percursos e visões muito próprias, na forma de comunicar e de interagir.
Em relação ao WP5, em particular, é, também, passar esta mensagem do impacto que a eficaz comunicação e disseminação do que fazemos tem, ou pode ter, para o projeto, para a Universidade de Aveiro e para cada uma das pessoas envolvidas no projeto. Estando a marca do Programa lançada, a associação ao projeto pode trazer vantagens a todos; também aos stakeholders externos, que sabem que existe uma equipa que consegue fazer esta articulação e que tem este mindset.
E depois existe, claro, um resultado muito relevante e que pode efetivamente ser uma mais-valia para os decisores: o Observatório para a Coesão Territorial, que irá estar integrado no projeto, e que inclui diversos indicadores para além dos socioeconómicos – que são os tipicamente usados – como por exemplo, na área da qualidade de vida. Isto pode ser absolutamente fundamental para atuar não curativamente, como muitas vezes é a forma de funcionar, mas preventivamente. Permite que possamos ter indicadores de risco numa determinada região, o que pode dar informação muito relevante aos decisores para poderem atuar preventivamente nesse sentido e, assim, aumentarem as possibilidades de inovação nos seus territórios.
Quais são as suas expectativas a curto, médio e longo prazo, nomeadamente sobre os resultados a serem alcançados com o Programa CeNTER?
O Observatório para a Coesão Territorial e o Banco de Iniciativas Inovadoras que, presumo, não irão ficar limitados ao tempo de vida deste Programa. Eu acho que um grande resultado do CeNTER é manter-se vivo pós-projeto. E quando refiro “vivo” falo em “dinâmico”, ou seja, ter as entidades externas envolvidas e que se autoalimente de uma forma natural, mesmo que sem uma equipa alargada e completamente dedicada, como acontece neste momento. A sua manutenção ao longo do tempo e a apropriação por parte do território seria, na minha ótica, o maior indicador de sucesso deste projeto.
O que há para lá do CeNTER, quer em termos profissionais quer em termos pessoais?
Na esfera profissional, há a paixão pela Psicologia Experimental e pelas Neurociências e, de uma forma geral, a paixão por desafios e por fazer coisas diferentes, que não sigam os trilhos convencionais; isso é algo que considero monótono. Por exemplo, a interligação com outras áreas – que façam sentido para o trabalho que vou fazendo – é algo que me entusiasma bastante, porque implica, uma vez mais, trilhos não convencionais e novas aprendizagens que me permitirão ter, cada vez, uma visão mais ampla sobre os fenómenos e as suas implicações e aplicações.
Ainda relativamente ao trabalho na Psicologia Experimental e nas Neurociências, que envolve muito trabalho de laboratório, queria salientar que interessa muito a abordagem translacional. Nesta dimensão, o CeNTER corresponde muito àquilo que é o meu objetivo de trabalho na minha área de investigação mais central, e que é não só fazer investigação básica – compreender os fenómenos –, mas também usar essa informação e conhecimento para que possa ter implicação prática. E, portanto, nas equipas em que trabalho, tenho simultaneamente investigação de caráter mais básico, fundamental ou laboratorial, e também o trabalho em esferas mais aplicadas, que me permitam levar o conhecimento produzido, do laboratório para contexto mais reais.
Para mim, fazer investigação sem essa dimensão é algo que não faz sentido. Naturalmente que muitos grupos trabalham uma ou outra dimensão, de forma isolada, mas eu tenho particular prazer em trabalhar ambas. Isto significa a possibilidade de transpor os resultados que alcanço em laboratório e os fenómenos que consigo compreender a partir desses resultados, para contextos reais. Isso é muito desafiador para mim e preenche-me particularmente, enquanto investigadora. É tipicamente aqui que surgem as colaborações com outras áreas científicas, no sentido em que complementam o nosso trabalho através do desenvolvimento de equipamento/material que permitem abordagens não invasivas e facilmente adaptáveis a diferentes contextos.
É também isto que fazemos no CeNTER. Não nos concentramos apenas na compreensão dos fenómenos; estamos também a usar a informação do território para o entender e depois devolvemos ao território aquilo que é o conhecimento que produzimos a partir daí. Portanto, esta bidirecionalidade é algo que me atrai particularmente e, para além da multidisciplinaridade do CeNTER, esse é outro que me faz estar nesta equipa de forma mais entusiasmada.
Do ponto de vista pessoal, há toda a dimensão social e de interação com a pessoas e de enfrentar novos desafios e oportunidades, que valorizo muito. Ler, viajar, descobrir novos locais e culturas, são tudo atividades que apaixonam.
Como é a vida para lá da investigação?
Esta dimensão social de que falava é central. E esta ideia de desafio que está sempre presente, quer na vida profissional, quer na pessoal. Conhecer novas pessoas, novos locais, ter diferentes dinâmicas, em diferentes contextos, e fazer coisas diferentes são ingredientes importantes na minha vida.
Ambição a 1 e a 10 anos.
Acho que me vejo a fazer as mesmas coisas. Importante é que se cumpram aqueles requisitos que referia (desafios, diversidade e o contacto com pessoas). Julgo que o se segue é absolutamente imprevisível, desde que cumpridos estes requisitos.
É muito importante para mim continuar a adorar o que faço e vir trabalhar sempre de sorriso e, portanto, vou abraçar e vou atrás de todas as oportunidades que me permitem manter nesse registo.