ENTREVISTA

21-fev.2020

Carlos Costa é Investigador do Programa “CeNTER – Redes e Comunidades para a Inovação Territorial”, onde assume responsabilidades de coordenação da investigação na área do turismo.

Tendo iniciado o seu percurso académico com a licenciatura em Engenharia do Ambiente – Planeamento Regional e Urbano, logo transitou para a área do turismo, a que se tem dedicado desde então. Concluído o Mestrado e o Doutoramento em Gestão em Turismo, em Surrey, Inglaterra, regressou a Portugal e à Universidade de Aveiro, para fundar a escola de turismo, com uma aposta pioneira nos projetos ligados ao Mestrado em Gestão e Planeamento em Turismo, o Doutoramento em Turismo, a Revista científica “Turismo e Desenvolvimento”, o Centro de Investigação GOVCOPP e a empresa spin-off da Universidade de Aveiro “‘idtour-unique solutions”.

Professor e Diretor do Departamento de Economia, Gestão, Engenharia Industrial e Turismo (DEGEIT) da Universidade de Aveiro, Carlos Costa é também Coordenador do Grupo de Investigação em Turismo e Desenvolvimento do Centro de Investigação em Governança, Competitividade e Políticas Públicas (GOVCOPP). A par da participação em inúmeros projetos de turismo, nacionais e internacionais, é ainda consultor da Agência Nacional de Acreditação (A3Es) de Portugal, da Fundação Nacional para a Ciência e Tecnologia (FCT) e de outras organizações internacionais.

Como se envolveu no Programa CeNTER?

Na verdade, o CeNTER é que acabou por chegar a mim, uma vez que o convite me chegou pelo Professor Filipe Teles, que me falou que haveria um projeto nesta área na região Centro, que ligava dinâmicas económicas, sociais e desenvolvimento.

Sabemos que o turismo é um setor incontornável na economia portuguesa, que já vale quase 20% do PIB, 10% dos postos de trabalho e 50% do total de exportações de serviços e irá ser cada vez mais, no futuro. O que acontece é que a região Centro, tal como todas as regiões do país, está numa fase de mudança do ponto de vista económico. Nós tínhamos, há 20 ou 30 anos, uma economia que se apoiava na indústria transformadora e hoje temos uma amálgama cada vez maior de atividades de serviços, e também uma maior qualidade de vida, de bem-estar. Com isso, o turismo deixou de ser uma atividade de praia e das férias, para ser uma atividade que tem a ver com a economia do dia-a-dia; tem a ver com lazer, com crescimento e com a qualificação de vida das pessoas. Assim se compreende o posicionamento do turismo neste Programa, mas também neste departamento [DEGEIT], que é diferente de todas as outras escolas. Enquanto que a maior parte das escolas prepara alunos para funções de guias e de operações de turismo, nós trabalhamos dentro daquilo que é a economia do turismo.

E qual o balanço que faz?

Acho que este é um belíssimo Programa, até por causa da tipologia de financiamento do projeto e da filosofia que tem subjacente, que se prende com a qualificação de recursos humanos. Neste momento, eu diria que este é um dos grandes desafios da região Centro: acima de tudo, coordenar sinergias entre diferentes formações e diferentes recursos humanos. E o CeNTER vem contribuir para isso, juntando várias equipas de vários interesses de investigação, desde as tecnologias ao território, ao turismo, etc.

Que momentos destaca como mais relevantes desde o início do projeto, em abril de 2017?

Eu destaco em particular o momento em que começámos a discutir quais as questões de investigação e as hipóteses que deveriam estar subjacentes ao projeto. Acho que todos os projetos, e este em particular, ao ser multifacetado precisava, acima de tudo, de uma plataforma de reunião e de comunhão entre os vários investigadores e recordo-me de ter estado numa reunião e de ter introduzido esse desafio. Sem isso, o projeto poder-se-ia ter tornado, e não é o caso, numa “banda desafinada”, sendo a equipa tão diversificada. Os projetos precisam de ter momentos de convergência, tanto sob o ponto de vista da investigação, como dos outputs que precisam de ter. E o rigor científico é necessário quer nos projetos de investigação pura, quer de investigação aplicada, sob pena de não terem outputs

E qual é, então, a abordagem proposta para a área do turismo e como se relaciona as outras áreas temáticas do Programa?

As questões do turismo podem ser abordadas de variadíssimas formas seja, por exemplo, numa perspetiva económica, ambiental, patrimonial, etc., sendo estas as abordagens ditas normais nos modelos de desenvolvimento para o turismo. Para um projeto com as características do CeNTER, o que precisamos é perceber como implementar determinadas medidas ou abordagens em duas dimensões. A primeira preocupa-se com a sua tradução em termos territoriais e das áreas que podem promover o desenvolvimento. A segunda, também relacionada com o território, associa-se com a tecnologia e estuda as redes e os canais de comunicação entre os diferentes parceiros e atividades que conseguem espoletar o processo de desenvolvimento. A questão que se coloca é termos uma área que é central – e com esta importância do turismo –, mas se não for operacionalizada, por exemplo através destas duas dimensões – território e redes – estaremos a falar de generalidades e considerações sem conseguirmos traduzir isto em termos práticos para o território.

Considerando a sua área científica e o trabalho que tem vindo a desenvolver, qual é o principal contributo que o Programa CeNTER oferece à região Centro?

Acima de tudo, temos vindo a enfatizar a perspetiva da economia. Quando trabalhamos pensamos como é que se criam polos e áreas de aglomeração capazes de criar riqueza – “polos de crescimento”, é um conceito dos anos 70 e aplicavam-se de uma forma universal à indústria transformadora. Portanto, começámos por perguntar como é que se conseguem criar polos de crescimento, e depois, numa segunda dimensão, como é que a partir desses polos se consegue irradiar crescimento económico e desenvolvimento socioeconómico. Isto em particular para as áreas de baixa densidade, porque o território não é todo povoado; há, sim, núcleos populacionais. A nossa investigação centra-se em perceber como é que a partir de determinados núcleos conseguimos encher esses polos e fazê-los crescer para que, por assim dizer, irradiem, para o território. E aqui surgem as tais aplicações, a organização física do território, os canais de comunicação que é necessário serem criados, porque hoje em dia já não é só através da vulgar comunicação física, pode ser através de redes sociais, de tecnologia. Aquilo que nós temos para fazer é conseguir comunicar e ligar todos pontos, que podem até estar ligados apenas virtualmente, mas não deixam de estar ligados.

Quais os principais desafios enquanto investigador do Programa CeNTER?

Fundamentalmente estão relacionados com as áreas de baixa densidade. A economia e gestão de polos de crescimento, como se gerem e como se pode induzir desenvolvimento são questões que já estão amplamente estudadas. Aliás, até temos [no DEGEIT] investigação a decorrer sobre o overtourism, o excesso de turismo. O que não temos ainda é a materialização de como é que as áreas de baixa densidade podem ser recetoras desse desenvolvimento, porque isso não é uma varinha mágica e depende fundamentalmente dos objetivos de desenvolvimento que se estabelecem para essas áreas, mas que em muitos casos ainda não sabemos quais são. É por isso que vemos florestas a arder, despovoamento, etc. Precisamos de saber como é que se consegue induzir desenvolvimento nesses locais e é isso que estamos a tentar cumprir. Para nós essa seria a grande contribuição do CeNTER: como promover desenvolvimento sustentado, economicamente e sob o ponto de vista ambiental, nas áreas de baixa densidade.

Quais são as suas expectativas a curto, médio e longo prazo, nomeadamente sobre os resultados a serem alcançados com o Programa CeNTER?

Destaco duas expectativas em específico. A primeira são os deliverables, o que foi produzido concretamente durante toda a duração do projeto. A segunda é a respetiva materialização, ou seja, perceber como é que toda a produção e conhecimento gerado – reuniões, inquéritos, papers, reflexões, etc. – podem ser colocados no terreno. Se se conseguir fazer isso, acho que se ganhou o projeto.

O que há para lá do CeNTER, quer em termos profissionais, quer em termos pessoais?

Há duas coisas que são centrais para mim: a família e o ser-se saudável, nomeadamente fisicamente, através da prática de desporto, ler, andar e arejar. E a minha vida pessoal concilia-se muito com a vida profissional porque eu ajusto-as de forma a poder sobreviver a 10-12 horas de trabalho diárias.

Em termos de futuro, sou católico, e o futuro a Deus pertence. Sei para onde quero ir e por onde não quero ir. Mas acima de tudo, o que faço é gozar o meu dia-a-dia. A qualidade do meu futuro depende da qualidade do meu presente e aquilo que eu consigo realizar hoje é que me vai dizer o que sou no futuro.

Não coloco metas altas. Sei que há algo cinzento lá a minha frente, o resto eu vivo é no dia-a-dia. Ou como dizia Adam Smith, a longo prazo estamos todos mortos.

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